Ministério da Justiça
Gabinete
da Ministra
Senhor
Presidente da LGDH, Senhor Presidente Honorário, Senhor Presidente da Comissão
Organizadora do Congresso, Ilustres Congressistas, Caros Amigos e Amigas,
Muito me honra estar aqui presente, a
título de Ministra da Justiça, para presidir a esta cerimónia de abertura de
mais um Congresso Ordinário. Mais de duas décadas de trabalho desenvolvido em
defesa dos Direitos Humanos na Guiné-Bissau falam por si.
Sei do que falo, pois tenho um percurso
nesta casa que muito me orgulha. Permitam-me referir que, junto à Comissão Nacional
da Direcção, fui Directora do Gabinete de Assistência Jurídica à Mulher e
Criança, Consultora e Formadora no âmbito dos Programas de Educação Cívica,
participei até numa missão internacional, como delegada da L.G.D.H. e da
Amnistia Internacional para a fiscalização do Acordo de Paz em Moçambique, em
representação do nosso país. E, em Fevereiro de 2013 fui credenciada como
representante da Liga em Portugal, para a divulgação do Relatório sobre a
Situação dos Direitos Humanos, reconhecendo-me como interlocutora privilegiada
da instituição; uma honra que aproveito para agradecer à Direcção cessante, em
sede deste Congresso.
Mas não se pense que o caminho tem sido
fácil. Num país assolado pela impunidade, facilmente se desrespeita a vida, ou
os mais elementares Direitos da Humanidade. Humanidade da qual o nosso país e
povo é uma magnífica amostra de diversidade e harmonia, apesar do seu pequeno
território.
Muitos e muitas, pelo meio de um longo
percurso, forçosamente sinuoso, atravessando tempos de graves conflitos e
clivagens internas, poderão ter discordado de uma ou de outra acção, das
prioridades estabelecidas, das figuras de proa, dos métodos de difusão ou de
outros aspectos desta organização, que chegou a ser acusada de
instrumentalização política. Críticas que deverão ser levadas em
consideração.
No entanto, a Liga consagrou-se, ao
longo das duas dúzias de anos que já leva de existência, como UMA REFERÊNCIA,
na denúncia das gritantes carências e fragilidades do país. Conseguindo,
quando a situação o justifica, ELEVAR A SUA VOZ, rapidamente difundida e
amplificada, pela CREDIBILIDADE QUE SOUBE CRIAR.
Como foi recentemente o caso de
violência ocorrida, e da agressão sofrida por um dos candidato à liderança da
CCIAS, num comunicado de repúdio datado do dia 11 do corrente, no qual se
exortava a Procuradoria-Geral da República a proceder à abertura de inquéritos
conclusivos sobre actos criminais que não gostaríamos que voltassem a ocorrer,
no espírito de concórdia e tranquilidade pública que privilegiamos.
Prezados Congressistas,
Sim, o nosso país transporta ainda um pesado
fardo em matéria de promoção e defesa dos Direitos Humanos. O que nos tem
levado a uma atitude envergonhada, com o habitual encolher de ombros e a dizer
baixinho «coisas nossas». O que é preciso combater.
A vergonha acumulada e o conformismo, a
ideia de que nada podemos fazer para mudar o estado de coisas, provocam o
alheamento do cidadão e da cidadã, em relação à coisa pública. Há coisas que
nos envergonham e que são inteiramente inaceitáveis e é bom que haja quem ajude
os governantes a fazerem o seu trabalho. E é a esse título que digo: OBRIGADO,
LIGA GUINEENSE!
Estou atenta e, no quadro das minhas
competências, cumprirei as minhas obrigações, esperando que o resto do sistema
cumpra igualmente as suas, em prol do BEM COLECTIVO QUE É A JUSTIÇA, na senda
dos desafios de verdadeira e sustentável mudança, para uma Guiné-Bissau
positiva, de cara lavada perante o mundo.
Vamos virar o bico ao prego: quando
poderemos nós dizer com orgulho, levantando a voz? «COISAS NOSSAS»!
Como diz o ditado, «ROMA E PAVIA NÃO SE FIZERAM
NUM DIA». Dada a fragilidade do Estado e a decadência administrativa a que
chegámos, há que PORFIAR NUM ÁRDUO TRABALHO, antes que possamos saborear os
frutos da ORDEM E ORGANIZAÇÃO, que a consolidação do Estado de Direito nos
promete. E, para isso, uma cooperação entre os vários actores é altamente
desejável. E não me refiro, evidentemente, apenas à Liga e ao Governo.
Relativamente ao Governo, permitam que
vos informe que, através da Comissão Nacional dos Direitos Humanos, já iniciámos
um Projecto de Promoção de Direitos Humanos, financiado pela União Africana,
cujas actividades programadas passam por inquéritos em zonas identificadas,
pela realização de uma magna reunião sobre a problemática geral dos Direitos
Humanos e por acções de divulgação e sensibilização acerca dos instrumentos
jurídicos nacionais e internacionais em matéria de Direitos Humanos.
Consequentemente, todos e todas os
denunciantes de qualquer tipo de injustiça, desde barbaridades, ilegalidades,
ou mesmo simples irregularidades, serão bem-vindos ou bem-vindas, porque, antes
mesmo que o sistema judicial consiga dar resposta, é importante que a opinião
pública seja informada, que o escândalo penalize os infractores.
No entanto, essas denúncias deverão ser
feitas desinteressadamente, em prol do bem comum, e não como perseguição
pessoal ou qualquer outra baixa motivação de conveniência. Deverão ainda ser
feitas com respeito, evitando ofender gratuitamente o DIREITO AO BOM NOME DE
PESSOAS OU INSTITUIÇÕES. E nunca associadas a incitações ao ódio e à violência.
Pois, não se combate o mal com outro mal.
Como já referi noutra ocasião, o
Ministério da Justiça tem em preparação uma PÁGINA NA INTERNET, que entre
outras funcionalidades, terá precisamente a da denúncia, que poderá ser ou não
anónima; outra funcionalidade prevista é a de uma pesquisa e revista periódica
de indícios de procedimentos criminosos nas redes sociais, graças a um
observatório criado especialmente para o efeito. Na medida em que a
proliferação de blogues, se tem inegáveis méritos na difusão de informação, com
alguns watchdogs bastante activos,
comporta também alguns riscos de actuações marginais. Dai que, a reflexão em
torno do enquadramento legal do ciberespaço decorre neste momento no mundo
inteiro e o nosso país não é excepção. Ou seja, os CRIMES INFORMÁTICOS não são
excepção. Ademais, a maior parte da nossa legislação encontra-se carente de um
grande esforço de adaptação à modernidade, à especificidade do país e dos
hábitos e costumes das suas gentes.
Caros Congressistas, Meus Amigos,
São conhecidas as graves deficiências do
nosso sistema judicial e seria fastioso estar a repeti-las aqui. Já fiz o
esforço de as tentar enumerar exaustivamente noutras ocasiões. Contudo, fazendo
uma analogia do nosso sistema judicial com uma linha de montagem, diria que a
máquina está muito enferrujada. HÁ IMENSA «MATÉRIA-PRIMA» PARA PROCESSAR, mas
devido a vários problemas, o produto final é muito limitado, tanto quantitativa
como qualitativamente.
Com tanto TRABALHO SISTEMATICAMENTE
ACUMULADO, há que pensar, com algum pragmatismo, que não será possível
garantir a justiça, ou sequer os meios de investigação, para todos os casos
historicamente denunciados ou conhecidos.
Naturalmente que algo de consistente tem
de ser feito em termos políticos, para colocar um termo a esta situação, bem
retratada pelo Estudo promovido pela Liga, há cerca de dois anos, intitulado
«40 anos de impunidade».
Assim, no Programa do Governo, prevemos
mecanismos de justiça de transição para a resolução de casos de impunidade,
através da realização duma Consulta Nacional, a institucionalização de "AUTORIDADE
NACIONAL PARA A MEMÓRIA E JUSTIÇA" (ANMJ), que visa nomeadamente o
estabelecimento da verdade dos acontecimentos, a justiça reparativa, a avaliação
da situação do infrator, e o arquivo, divulgação e memória futura. Por isso,
pediria a colaboração da Liga, para apoiar na constituição e funcionamento desta
Autoridade Nacional que, outrossim, visa garantir às vítimas, ou suas famílias,
em tempo útil, o Direito a uma reparação, traduzindo-se, no mínimo, numa reabilitação
pública.
Quando o Primeiro-Ministro me lançou o
desafio da pasta da Justiça, aceitei acreditando que a Guiné estava perante uma
oportunidade especial de estabilidade e de continuidade na formatação como
Estado Consolidado de Direito, pela legitimidade adquirida nas urnas pelo
Partido vencedor, para um mandato de quatro anos. Com tanta coisa por fazer,
não teremos mãos a medir, para ganhar a aposta da dignidade do Estado, mas
precisamos de dar continuidade ao nosso esforço, num contexto de solidariedade
institucional entre os vários órgãos de soberania.
Ilustres Congressistas,
Não quero terminar sem uma palavra de
estímulo. Desejo-vos um bom trabalho e que deste IIIº Congresso da Nossa Liga
saiam também as habituais orientações que fortifiquem ainda mais a instituição
nos caminhos que continuará a percorrer na promoção e defesa dos Direitos
Humanos na Guiné-Bissau.
Muito obrigada pela vossa atenção