segunda-feira, 21 de outubro de 2013

OPINIÃO: O PERFIL IDEAL DO FUTURO PRESIDENTE DA GUINÉ-BISSAU EM 10 CRITÉRIOS

Desde o mito da sua fundação, a Guiné-Bissau, por razões próprias à dinâmica da sua ascensão à independência conhece até hoje um ciclo de violências político-militar, abuso de poder, implicando pessoas que lideram partidos políticos num sistema politico constitucional semipresidencialista, propício a conflitos entre o Presidente da República e o Primeiro Ministro ainda que provenham do mesmo partido.


 Aliás, o Presidente da República e o Primeiro Ministro em todas as legislaturas pertenciam ao mesmo partido. Os problemas pessoais não resolvidos nos partidos são transferidos para o quadro nacional e são resolvidos no aparelho estatal com consequências que todos nós conhecemos.
Hoje, os dois maiores partidos da Guiné estão numa fase transitória que a própria dinâmica social e demográfica obriga. O PRS mudou de liderança, mesmo que seja uma mera formalidade que não se confirma na realidade, e o PAIGC esta em plena campanha interna para escolher os seus dirigentes.

 O último golpe de Estado de 12 de abril 2012 demonstrou que a Guiné é refém dos dois partidos políticos acima referidos que partilham responsabilidades do desastre nacional. Da data da proclamação da independência – 1974, até à abertura democrática em 1994, o partido no poder, o PAIGC, cometeu vários crimes económicos e de sangue que nunca foram elucidados e que estão na base da rotura do contrato social que estava em vias de construção. 
Após a abertura democrática em 1994, os ajustes de conta entre os libertadores acabaram por arrastar o país numa guerra civil de onze meses – Junho de 1998 a Maio de 1999. Nas eleições de 1999/2000 o PAIGC foi sancionado e o PRS chega ao poder, mal preparado para dirigir a Guiné sucedendo um outro golpe de Estado que a classe politica saudou, aceitando assim o golpe de Estado como modo de sanção politica na era democrática. A partir daí, o país entra numa espiral de golpes e contra golpes, não só de Estado, mas também no seio dos partidos políticos. 
Para as próximas eleições, ainda que não tenha data real marcada, é a partir de agora que se deve estabelecer o perfil ideal do futuro Presidente da República, aquele que deve estar acima dos jogos inter e intra partidárias para que haja possibilidade de construção da estabilidade, da justiça e da paz, e para que o futuro Presidente da República possa vir a dar impulsos necessários que sustenham a esperança, a coesão nacional, a estabilidade e a paz uma vez que estes são fundamentais para o crescimento económico.
 Assim sendo, partilho a minha humilde opinião sobre o perfil ideal, do candidato para o cargo do Primeiro Magistrado da Nação, enumerando 10 critérios que julgo imperativo, no nosso contexto, para que a Guiné-Bissau possa dar um salto qualitativo rumo ao desenvolvimento, apoiando-se na paz para e com o crescimento económico. Para cada critério se associam indicadores.
 1°critério : Ética e integridade.
O candidato ideal seria aquele que nunca tenha sido acusado de desvio de dinheiro público, nem sequer ouvido(a) pela justiça, que nunca tenha sido condenada(o) e que sobre ele (a) não paira suspeita à volta da sua pessoa por motivos de roubo, tráfico de droga, crime imobiliário, sexual ou de sangue.
Este critério é capital para se ter autoridade moral suficiente o que facilitaria a tarefa de impulsionar a reforma da justiça e pôr termo a impunidade. A moralidade é a pedra angular do critério. Esta moralidade abrange tanto a vida pública como a privada. Em suma, o candidato deveria estar em condições de posicionar-se como referencia e modelo para o ‘’novo’’ guineense, aquele cujas qualidades reflita o que a mãe guineense aspira para o seu filho. Quem poderá satisfazer a este critério?
2°critério : Independência de pensamento, de acção e uma visão clara sobre o desenvolvimento do país


Ser uma pessoa suficientemente independente da influência dos actores politicos e da sociedade castrense para se posicionar politicamente acima das querelas partidárias. Ser uma pessoa que impõe respeito no seio de qualquer estrutura organizada da sociedade guineense por causa da sua integridade moral, das suas competências, da sua capacidade de liderança, da sua visão estratégica sobre o futuro da Guiné-Bissau e da sua rede de influência quer na Guiné, quer ainda no exterior. Quem poderá satisfazer a este critério?
 
3°criterio : Suficiente meios próprios de subsistência
Ter suficientemente meios de subsistência para não ceder à tentação de desviar fundos e bens públicos, de se comprometer em transações fraudulentas ou duvidosas ou simplesmente de satisfazer sonhos de grandeza. O cargo do Primeiro Magistrado da Nação é um cargo de visionário, de estratega. Quem poderá satisfazer a este critério? 
4° critério : Faixa etária
A faixa etaria do candidato deve estar compreendida entre os 45 e os 60 anos. O candidato deve gozar das suas plenas capacidades intelectuais e fisicas. A Constituição impõe a idade de 35 anos para poder ser candidato ao cargo de Presidente da Republica, mas não impõe limite. As características do país deve poder impôr esse limite, de forma consensual, pois os desafios são enormes. A Guiné-Bissau é um pais de jovens e estes esperam um futuro melhor num mundo de complexidade cada vez maior e enfrentando os desafios da globalização. Quem poderá satisfazer a este critério? 
5°critério : Suficiente conhecimento das realidades guineense
Conhecer a sociedade e as diversidades culturais guineenses no seu todo e na sua complexidade. Como todos sabemos 60% de população vive no meio rural, 30% no urbano e 10% na diáspora (que apoiam a subsistência das familias na Guiné e contribuem para travar a miséria), com uma superposição de crenças diversas (animistas, cristã e muçulmana). É importante poder identificar-se com os cidadãos do interior, das cidades e da diáspora, para poder incarnar a Nação na sua diversidade, essa diversidade compreendida como uma riqueza. Para estar ao serviço do Povo é preciso ouvi-lo, para ouvi-lo é preciso conhecê-lo. O futuro Presidente deve falar, além do crioulo que é nossa língua comum, uma ou senão várias línguas nacionais. Quem poderá satisfazer a este critério?
6°criterio : Formação académica superior :
Ser um quadro superior de qualidade e ter uma experiência na gestão dos assuntos do Estado. Deste modo o candidato deve ser uma pessoa que já assumiu responsabilidades ao alto nivel no aparelho do Estado ou/e numa organização internacional especializada nas questões de desenvolvimento e transformação económica dos Estados frágeis ou em situação de pós-conflitos e que já geriu « dossiers » importantes no âmbito de politicas públicas com sucessos. Os tempos actuais requerem mais do que simples aprendizes. Quem poderá satisfazer a este critério?
7°critério : Conhecedor dos desafios socio-politico, climatologicos e económicas e geopolíticos
O candidato deve conhecer os desafios e as ameaças sociais, políticas, climatológicas, económicas e geopolíticas que corre a Guiné-Bissau e ser capaz de anticipá-los propondo um plano de sociedade credível que abrange toda a Nação em particular, os jovens que serão os continuidores do projecto societal, as mulheres que asseguram a economia, a gestão diária das familias e que investem na educação das crianças e dos jovens contra ventos e marés. Isso presupõe capacidade de construir consenso à volta do modelo societal e alianças com outros Estados a volta de interesses geopoliticos e geostratégicos comums. A capacidade requerida  neste critério é a dimensão de homem de Estado de estatura internacional. Quem poderá satisfazer a este critério?
8°critério : Conhecedor das instituições internacionais
Mais de que nunca a Guiné-Bissau precisa de apoios internacionais nas àreas social, politica e económica. O futuro Presidente da República deve ter um conhecimento averiguado e ser conhecido das Instituições internacionais. Este criterio trata da capacidade estrategica de negociar com os parceiros de desenvolvimento e de estrategicamente evitar ser refém dos dogmatismos ou doutrinas. A Guiné-Bisssau espanta com a sua banalização da educação e com escolhas de dirigentes semi-analfabetos num contexto de globalização que expressa uma crescente interdependência das economias nacionais e a emergencia de um sistema transnacional (financeiro, produtivo e comunicativo). Quem poderá satisfazer a este critério?
9°critério : Comunicação e multilinguismo
A imagem internacional da Guiné é péssima e resume-se em : violência (guerras e assassinato bárbaro de um Presidente da República), tribalismo, ignorância instalada e tráfico de droga. É imperativo que o próximo Presidente da República possa ter uma cultura geral equivalente se não superior á dos seus pares dos países com quem, nas suas funções é chamado a tratar (no sentido estatal do termo). Comunicar correctamente na sua lingua oficial e nas duas línguas internacionais de relevo: o francês e o inglês constituem por si só capacidadade de relacionar com os pares, de ganhar confiança, de contribuir para criação de uma imagem positiva do país. O que sustenta este argumento é a necessaria credibilidade na pessoa do Presidente da República perante os seus homólogos, que passa pela sua excelente capacidade comunicativa. Quem poderá satisfazer a este critério?
10° critério : Ter influência de relevo em organismos internacionais
Ter influência e respeito nas Organizações financeiras internacionais, nas redes financeiras de empresas multinacionais, para que quando fôr necessario ajudar a Guiné-Bissau, só a sua pessoa seja uma garantia suficiente para que haja parceria pública-privada nos projectos estruturantes de grande envergadura que criam riqueza não só para a Guiné-Bissau, mas também para os guineenses. Isso é fundamental para dar esperança ao País e para que os próprios guineenses se reconciliem entre si e que possam acreditar que dias melhores viram. Isto pressupõe que o futuro Presidente da República deve ter bastante à vontade com os grandes dirigentes politicos e económicos deste mundo. O mundo onde vivemos é um mundo onde redes de relações pessoais têem uma importância capital nas decisões a serem tomadas a nivel de Estado. Ninguém vai querer ajudar a Guiné só porque o programa de desenvolvimento foi bem concebido ou porque gostam dos guineenses. Essa teoria populista não justifica o desembolso de vários milhões de dólares. E o realismo. Quem satisfaz a este critério?


Esta é a minha contribuição à « consciência colectiva » dos meus compatriotas sobre o perfil ideal do futuro Presidente da República. Com ou sem data real marcada para as eleições, terei contribuido se estes critérios sobre o perfil do homem capaz de conduzir o nosso destino sirvam de base para refletir antes de se tomar a decisão de oferecer o apoio a um determinado candidato.
Alfredo Alves
Email: alfralves@outlook.com