Depois
da independência, o PAIGC considerou-se dono e senhor do país, alegando motivos
de ter sido o libertador do povo, como se isso fosse a verdade absoluta e
indiscutível.
O povo da Guiné sempre se bateu pela sua liberdade
contra o domínio português, desde há muito tempo e muito antes da existência do
PAIGC. Basta lembrar a chamada guerra da pacificação de 1913 a 1915 em que foi
morto em combate o comandante do exército colonial, o capitão João Teixeira
Pinto.
Ninguém
e nem movimento algum consegue libertar um povo sem que este esteja envolvido
de corpo e alma na luta pela sua liberdade. A verdade é que nesta luta tem de
haver, necessariamente, uma liderança, papel que o PAIGC exerceu com o sucesso
inegável. Mas daí querer arvorar-se como libertador é uma mera pretensão que o
povo guineense não devia aceitar. Infelizmente, a operação de castração mental
levada a cabo pelo partido “libertador” e cimentado pela desumana repressão e
carnificina fez com que o povo adormecesse com o medo de questionar e refletir
sobre a verdadeira história da luta pela independência, acabando por
interiorizar no seu subconsciente a conclusão sobre a “verdade” partidária,
partindo de falsas premissas.
O PAIGC elegeu a independência como a sua única
causa durante a luta da libertação e abandonou as outras subsequentes de
maior importância para organização do estado de direito, com vista ao
desenvolvimento, transformando-se num partido dos casos: intriga, corrupção,
peculato, nepotismo, enriquecimento fácil e disputa desenfreada de lugares no
governo ou nos altos cargos públicos. A independência era o seu único
objectivo, uma vez conseguida, achou a sua missão terminada. Então, chegou o
momento de pedir contas ao povo pelo que tinha feito nas matas para a sua
“libertação”. Se o julga ser credor da dívida da liberdade do povo, que fique a
saber que a referida dívida já foi saldada de há bastante tempo com os juros
incomensuráveis. O que o povo agora espera deste partido é que o deixe em paz,
abandonando a cena da política nacional, porque se tem revelado incapaz de
lidar com os problemas do país, desde que chegou ao poder.
O PAIGC nem sequer foi capaz de conservar, pelo menos,
as infraestruturas e o património herdados da administração colonial, tudo se
encontra na mais completa degradação. O PAIGC é tão incapaz até para resolver
os problemas internos criados por ele mesmo. Senão, vejamos. A presente crise
no país teve origem no seu seio, devido às intrigas de que são especialistas os
seus membros na disputa de poder, mas até ao momento ainda não conseguiu
ultrapassá-la, mantendo a Guiné como refém dos interesses, meramente,
partidários.
Como é que um partido que tem um presidente da
república, um primeiro-ministro e uma maioria parlamentar não consegue chegar
ao consenso a bem do país? Enquanto o PAIGC se mantiver no arco de poder na
Guiné-Bissau, beneficiando-se da ignorância literal da esmagadora maioria do
povo guineense, o país vai continuar a viver sob as crises cíclicas
intermináveis e, por conseguinte, não haverá estabilidade duradoira e muito
menos o desenvolvimento sustentável.
O país precisa, urgentemente, dos investimentos de
capital estrangeiro como de pão para a boca. Todavia, é indispensável a
confiança alicerçada em clima de estabilidade permanente, mas o PAIGC como
destabilizador inato não vai deixar o país em sossego. Este partido
reina na Guiné, porque esta não tem ainda gente capaz de o destronar, de
uma vez por todas, dado que o povo já está cansado de o aturar. Só que não tem
encontrado até agora o substituto à altura dos pergaminhos do país. Apenas têm
aparecido como cogumelos políticos vendedores da banha da cobra e
charlatões, quando há eleições, mas depois entram em hibernação até às novas
legislaturas.
A recente crise tem a ver com a prática ancestral da
velha guarda paigeísta habituada a viver sugando erário público, quando se
instala no poder, condicionando o rumo de governação. Não se pode analisar a
actual conjuntura do país apenas à luz do formalismo constitucional, o qual não
tem a única interpretação em qualquer país pelos diferentes
constitucionalistas. Há que ir à substância dos problemas subjacentes à crise
ocorrente. Mas surgem comentadores que mais parecem porta-vozes do
governo demitido e alheios ao drama do povo, desde há quarenta anos. Pois, a
verdade vencerá sobre a mentira bem orquestrada, escondendo os inconfessáveis
interesses prejudiciais ao país.
FONTE: O PÚBLICO