O Historiador guineense radicado em
Portugal, Julião Sousa Soares considera “semipresidencialismo puro” o
sistema de governo que mais se adapta a realidade da Guiné-Bissau.
Em entrevista exclusiva à ANG
sobre as sucessivas instabilidades políticas desde a instituição do
multipartidarismo nos inícios de ano noventa no país, o académico disse que
“contrariamente” a tese defendida por um importante sector da sociedade,
o presidencialismo pode ser perigoso para o país.
“A corrente que eu defendo para o meu
país é o semi-presidencialismo assumido claramente (como em Portugal e Cabo
Verde), em que o Presidente da República tenha um papel de moderação de debate
político, se por exemplo houver problemas no país,” advoga o historiador
para acrescentar que um presidencialismo na Guiné-Bissau pode conduzir
“rapidamente o país à ditadura”.
Sousa Soares sustenta que quem
conhece a realidade do país e a característica dum africano que
“tradicionalmente gosta de concentrar o poder”, não tardará a concluir que o sistema
semi-presidencialista mais se encaixa para evitar o totalitarismo.
Abordado sobre outras causas dos
conflitos políticos interinstitucionais que, em algumas situações acabariam por
facilitar a intervenção dos militares, este estudioso fala em motivos
“subjectivos” como, rumores, boatos intrigas, “em que não se olha os
meios para atingir o poder” e a falta de moral.
A “falta de moral” é segundo Julião
Soares, o “maior cancro” de uma parte da classe política do país.
Em relação as “razões de ordem
objectiva”, Julião Soares resume-as em má governação e sucessivos
assassinatos no país desde os primórdios da independência. Facto que,
segundo as suas palavras, causaram ódios entre as pessoas.
Soares afirma que nenhum país pode
crescer com lutas “desmedidas pelo poder.
Como estratégia para alterar o actual
figurino constitucional (semi-presidencialismo com pendor presidencialista), Soares Sousa aconselha um “debate aprofundado” sobre a temática,
que poderá culminar com a uma promulgação do texto constitucional revisto, por
um Presidente da República no final do seu segundo mandato.
“Como se sabe, nenhum Presidente de
República aceitaria reduzir os seus poderes no pleno exercício das suas
funções. Já, por exemplo, no final dum segundo mandato (não renovável), seria
possível a revisão da Constituição, porque qualquer chefe de Estado
gostaria de ficar na historia”, aconselha.
Face aos sucessivos males há anos à esta
parte na governação do país, Soares Sousa afirma que tem levado o “divórcio” entre a população e as autoridades,
“porque o Estado não cumpriu com o seu papel de garantir as
necessidades básicas” tais como infra-estruturas, uma educação e um
sistema de saúde de qualidades, o emprego e as condições de vida dignas aos
cidadãos.
“Um povo não sobrevive apenas de
discursos, as vezes demagógicos. Já é hora de os governantes compreenderem que,
o que conta é a prática”, acusa o historiador para afirmar que a
Guiné-Bissau só conhecerá uma “verdadeira mudança, com políticos de elevado
sentido patriótico e conhecedores dos reais problemas dos cidadãos”.
Por isso, o professor chama a atenção
“por esta exclusão social” que na sua perspectiva, se as coisas não se
inverterem poderá, à médio e longo prazos, eclodir as “convulsões sociais” como
tem acontecido noutros países.
Julião Sousa Soares considera
“fundamental”, o diálogo nacional com todas as forças vivas do país, em
particular, entre os órgãos da soberania, através de encontros periódicos (
“não na praça pública como se sucede”).
Apesar da situação difícil em que se
encontra, apela ao povo guineense a ter a esperança num futuro melhor, aos
políticos exorta um diálogo permanente e, finalmente, à comunidade
internacional pede que continue a “apoiar ao povo guineense que tem sido a principal
vítima inocentemente, dos sucessivos erros de governação” da Guiné-Bissau.
Desde a instituição do multipartidarismo
no país, no início da década noventa, até a presente data nenhum governo
concluiu o seu mandato constitucional de quatro anos.
Julião Soares Sousa, natural de Bula,
norte do país, é doutorado em História Contemporânea, autor do livro “Amílcar
Cabral 1924-1973, Vida e Morte dum Revolucionário Africano”.
Obra esta que lhe valeu o Prémio pela
Fundação Calouste Gulbenkian de “História Moderna e Contemporânea de Portugal”
da Academia Portuguesa de História.
Actualmente, o Professor Julião Soares
Sousa está ligado a Universidade de Coimbra, Portugal, como investigador.
Instituição de ensino onde fez os seus estudos superiores.
Fonte. ANG